BLOQUEIO CONTINENTAL
Em 21 de novembro de 1806, Napoleão Bonaparte emitiu o Decreto de Berlim que pôs em vigor um embargo em grande escala contra o comércio britânico, conhecido como Bloqueio Continental. O decreto proibia a importação de mercadorias britânicas por qualquer país europeu, aliado ou dependente da França. Todas as conexões com a Grã-Bretanha foram cortadas, até mesmo o correio. O objetivo desse embargo em escala continental era arruinar a economia britânica. A medida que foi mantida – não sem grandes dificuldades – até 1814, teve resultados contraditórios.
A guerra de bloqueios
A disputa entre a Inglaterra e França vinha desde antes do Bloqueio Continental. A Grã-Bretanha já havia imposto um bloqueio naval às cidades portuárias francesas em 1793. A França respondeu, em 1796, proibindo a importação de mercadorias britânicas em todo país.
No começo do século XIX, o continente europeu vivia as agitações políticas e militares causadas pelo domínio napoleônico. A França conquistava diversos territórios e modernizava a sua economia a contragosto das diversas monarquias que repudiavam o processo revolucionário daquele país. Entre esses opositores estava a Inglaterra, uma potência industrial e uma das poucas nações que tinham condições econômicas e bélicas para se contrapor ao governo de Napoleão Bonaparte.
O bloqueio de 1806 estendeu-a à Europa como resultado das vitórias militares de Napoleão. Contribuiu para isso a derrota francesa na batalha naval de Trafalgar, em 21 de outubro de 1805.
Como bom estrategista que era, e ciente do poder de seu mais importante rival, Napoleão Bonaparte resolveu tomar uma medida de natureza autoritária, Decretando o Bloqueio Continental em 21 Dezembro de 1806. À época da Terceira Coligação das Guerras Napoleônicas, o documento estabelecia que todos os portos da Europa deveriam fechar suas portas para as embarcações inglesas. Desse modo, a França expandiria o seu mercado consumidor, ao mesmo tempo em que enfraqueceriam a hegemonia econômica de seu maior rival nos campos de batalha, já que cerca de 1/3 da exportação britânica era destinada à Europa continental e também, dependia das importações de grãos dos Estados Bálticos e da Rússia o que incluía a madeira para sua indústria naval.
Com o bloqueio continental, as importações britânicas passaram a vir principalmente do Canadá. O Decreto de Milão, de 1807, estendeu o bloqueio a todos navios – independentes da bandeira sob a qual navegavam – que tivessem aportado na Grã-Bretanha ou se submetessem aos controles britânicos. Eles seriam confiscados imediatamente incluindo as mercadorias a bordo.
o Bloqueio proibiu os países europeus a realizarem qualquer comércio com o Império Britânico e, mais, obrigou todos os navios comerciantes que entravam ou saíam da Europa a passar por portos franceses para serem vistoriados. Fácil é perceber que o objetivo era destruir a capacidade dos ingleses de realizarem comércio, essencial para manutenção do império. Sem o comércio, a economia inglesa colapsaria e o Reino Unido se tornaria mais frágil.
As dificuldades em manter o bloqueio
Depois do decreto de
licenças para os Estados Unidos, a França viu-se forçada a emitir outros
decretos similares para não causar um colapso no abastecimento europeu, uma vez
que não era capaz de suprir toda demanda, e também como medida para deter o
contrabando que desviava uma fonte adicional de receitas.
Para controlar o bloqueio,
Napoleão enviou 40 oficiais da alfândega francesa a estados ocupados ou
neutros. Estabeleceu uma linha aduaneira a partir da Holanda até a costa norte
da Alemanha. Tropas francesas também vigiavam os portos. Mercadorias britânicas
apreendidas eram incineradas.
Só no mês de novembro de
1810, ocorreram cinco fogueiras de manufaturados britânicos em Frankfurt. A
fiscalização francesa foi quase unicamente por terra.
Depois da derrota de
Trafalgar, a França não tinha mais uma frota suficientemente grande para
“fechar” a vasta costa do continente. A eficácia do Bloqueio Continental variou
entre o norte e o sul da Europa. As tropas francesas no Mar do Norte e no
Báltico conseguiram deter grande parte do contrabando. No Mediterrâneo,
porém, a situação foi diferente. Os britânicos contavam com seus portos de
Malta e Gibraltar e, também, com as bases navais da Sardenha e Sicília para
furar o bloqueio.
Durante o Bloqueio
Continental, esses pontos receberam um volume quatro vezes maior de mercadorias
britânicas. A guerra de Napoleão contra a Espanha (1807-1814) abriu outro
buraco no bloqueio.
Napoleão ordenou severa fiscalização contra os contrabandistas que furavam o bloqueio em diversos pontos da costa européia (à direita). As mercadorias apreendidas eram queimadas (à esquerda). |
Nova estratégia de Napoleão
para manter o bloqueio
A partir de 1810, Napoleão
flexibilizou o bloqueio permitindo um contrabando “controlado” visando arruinar
a economia britânica. Abriu os portos franceses de Dunquerque e
Gravelines, no norte do país, para contrabandistas ingleses que comprassem as
licenças pagando em ouro. Eles também poderiam adquirir mercadorias francesas mediante
pagamento em ouro.
O ouro trazido pelos contrabandistas ingleses serviu para financiar a onerosa campanha de Napoleão na Península Ibérica. Em Gravelines, até 300 contrabandistas compravam têxteis, vinhos e gim franceses.
Efeitos do bloqueio no comércio
O Bloqueio Continental teve
resultados contraditórios para o comércio. Nem todos os setores da
economia foram afetados negativamente.
No Reino Unido, a importação
de produtos coloniais permaneceu intocada, enquanto os entraves no fornecimento
de têxteis e madeira não afetaram a produção industrial britânica. Apesar das
exportações britânicas para o continente caírem entre 25% e 55% em comparação
aos níveis anteriores a 1806, o expressivo aumento do comércio com o resto do
mundo, cobriu grande parte das perdas britânicas na Europa.
Para a França, o bloqueio
teve consequências diversas. O comércio colonial francês entrou em colapso com
o bloqueio naval britânico devido a perda de acesso às colônias. Por
outro lado, sem a concorrência inglesa, a indústria francesa de algodão
recuperou-se. Os países sob a esfera de influência francesa foram forçados a
adquirir produtos franceses. Assim, a curto prazo, a França lucrou com o
bloqueio continental. As guerras napoleônicas, porém, endividaram os potenciais
compradores e, portanto, a médio prazo, ocorreu o declínio nas vendas francesas
o que contribuiu para o declínio do Império Francês.
O Bloqueio Continental
estimulou a industrialização dos estados alemães, em especial, a indústria de
algodão mecanizado na Saxônia e na Renânia, beneficiada com a perda da concorrência
britânica. Entre 1806 e 1813, o número de fábricas de processamento de
algodão na Saxônia aumentou vinte vezes. As indústrias de armamento e ferro
também lucraram.
A redução de produtos
coloniais na Europa, levou a adaptações e invenções. O café foi substituído por
pó de chicória, o açúcar de cana pelo de beterraba, e o corante azul índigo com
tintura. Isso criou as bases para uma indústria química posterior,
especialmente na França e na Alemanha.
O açúcar de beterraba já era
conhecido antes do bloqueio, sua produção, porém era pequena já que a colônia
francesa de São Domingo abastecia o continente europeu com açúcar de cana.
Durante o processo de independência dessa colônia (Haiti), o comércio de açúcar
entrou em colapso na Europa. Muitos cientistas se empenharam em resolver a
questão, entre eles o alemão Franz Carl Achard que desenvolveu a técnica para a
produção de açúcar a partir da beterraba. Napoleão abraçou a novidade. Em um
decreto de 25 de março de 1811, ele ordenou o cultivo de beterraba sacarina, na
França, em uma área total de 32.000 hectares. Seis escolas experimentais deviam
supervisionar e melhorar a produção. Em 1812, já existiam 150 fábricas de
beterraba sacarina na França.
A ineficácia do bloqueio
O Bloqueio Continental não
obteve o que pretendia: arruinar a economia britânica. A balança comercial
britânica não foi seriamente prejudicada.
Para que o Bloqueio
Continental tivesse total eficácia, a França dependia de que todos os países da
Europa aderissem á idéia, e para isso era necessária a adesão de todos os
portos localizados nos extremos do Continente. Os portos dos impérios russo,
austríaco e português eram os quais Napoleão precisava para seu êxito total no
decreto.
O bloqueio ficou, de fato,
restrito apenas a partes da Europa. A França não tinha uma frota necessária
para impedir o acesso da Grã-Bretanha às suas colônias ou a outras regiões do
planeta. O bloqueio levou a Grã-Bretanha a expandir seu império colonial às
ilhas de Cabo Verde e na Ásia (ilhas do Pacífico, Índia, China e sudeste
asiático). O comércio internacional britânico voltou-se com mais vigor para a
Américas do Sul e Central, que passaram a ter maior presença nas negociações
com a Grã-Bretanha.
Aproveitando as convulsões
internas na Espanha, a Grã-Bretanha pressionou o governo espanhol a abrir o
comércio do império colonial espanhol aos fornecedores britânicos. Medida
similar foi obtida junto a Portugal que resultou na Abertura dos Portos às
Nações Amigas, em 1808. Situação semelhante ocorreu nas colônias holandesas, na
Colônia do Cabo (Índias Orientais holandesas), que tendo suas metrópoles
invadidas por Napoleão tiveram que aceitar o apoio naval britânico para
manter as relações comerciais com suas colônias.
Uma das situações mais
complicadas se deu com o caso português que tinha a nação que servia de
porta de entrada para a Europa Continental e dependia sobremaneira dos produtos
industrializados britânicos.
Militarmente, os portugueses
não teriam como resistir a um ataque das tropas de Napoleão Bonaparte ao seu
território. Economicamente, era impossível que os portugueses abrissem mão do
consumo de mercadorias britânicas. Mediante esse impasse, Dom João VI, príncipe
regente da época, procurou adotar uma postura neutra junto às duas potências
que o pressionavam.
Ele não podia romper com a
Inglaterra devido a sua dependência econômica em relação a ela. E também não
podia romper com a frança, pois em caso de ataque perderia a coroa, uma vez que
não tinha como vencer a França.
Tentou se manter neutro o quanto pôde, mas acabou por ceder, preferindo aliar-se aos ingleses (perderiam o reino de Portugal, mas manteriam a coroa e o comércio com os Ingleses). O reino de Portugal assinou uma convenção secreta, na qual ficava decidida a transferência do governo português para o Brasil. Enquanto os ingleses se comprometiam a defender o território lusitano contra a França. A Coroa Portuguesa entregava, assim, sua esquadra e garantia a abertura dos portos brasileiros para os ingleses.
No dia 29 de novembro de 1807, diversas embarcações saíram de Portugal levando a nobreza e a Família Real daquele país ao Brasil. Viajaram 15 mil pessoas entre nobres e criados que chegaram ao Brasil em 22de janeiro de 1808.
Enfim, o Bloqueio Continental fracassou em seu objetivo principal: prejudicar irreparavelmente a economia britânica por meio de um embargo comercial. O bloqueio causou mais danos colaterais ao Império Francês do que ao Reino Unido.
A Rússia sofreu particularmente com o bloqueio que a privou de seus principais parceiros comerciais no Báltico e no Mar do Norte. Em 1812, o czar Alexandre I decidiu reabrir o comércio russo com a Grã-Bretanha o levou Napoleão invadir a Rússia com uma força de mais de meio milhão de homens, um esforço que fracassou completamente e causou a ruína final do Império Francês.
Comentários
Postar um comentário